segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

26º dia de Cajamarca a Shorey 270 km




26º dia 
Dia 01 de janeiro de 2017
  
Trajeto do dia 

Saí do hotel as 8 horas e mesmo sabendo que o acesso as Ventanillas de Otuzco estaria fechado eu fui até lá. Ficava a 15 km de onde eu estava. Passei por Banhos del Inca novamente e segui por uma estradinha de lama até chegar a estrada de acesso as ventanillas. Não pude entrar no sítio, mas pude ver da rua, não podia ir embora sem ir lá ver. 
As Ventanillas de Otuzco são um cemitério da cultura Cajamarca que habitou a região entre os séculos III e VIII e estão a 2.850 metros de altitude. Seus mortos eram depositados nestas "janelas", algumas com até 10 metros de profundidade e outras interligadas. Os mortos eram primeiro enterrados na terra e posteriormente depositados neste local, servindo como um ossário e possivel lugar de veneração dos mortos.
Chovia ainda e segui para tentar chegar ao Canion del Pato ainda naquele dia. Em meu roteiro tinha  uns 120 km de estradas de chão para passar e a chuva possivelmente dificultaria o meu progresso neste tipo de terreno.

 

Ventanillas de Otuzco 

Continuei então pela ruta 3N por um caminho agora não tão sinuoso eu podia manter uma velocidade um pouco maior, uma vez que p visual desta região já não é assim tão bonito. Perto das 15 horas eu estava na laguna Suasacocha, tinha uma grande festividade lá e muitas pessoas pela rua, também muita gente "emborrachada" (bebada), passei devagar olhando, mas não parei. Segui para Huamachuco, onde teriam 2 sítios para visitar, eram eles Markahuamachuco eWiracochapampa. Chegando lá me informei na delegacia como chegar em Wiracochapampa, que era mais perto, e então segui pra lá. Cheguei lá já passava das 16 horas, estacionei a moto e o guarda que controla a entrada de pessoas lá veio a meu encontro para saber de onde eu vinha, expliquei de onde vinha e ele se ofereceu para me guiar sem custo algum pelas ruínas. Aceitei e seguimos, ele um grande apreciador da história do povo dele me mostrou cada um dos lugares das ruínas explicando a funcionalidade e detalhes construtivos. Percebia-se que ele contava tudo aquilo com muito prazer e orgulho. Me senti privilegiado por ter ele como guia, uma vez que não era a função dele. Andamos por quase uma hora pelo sítio, que tinha poucos visitantes.
Wiracochapampa foi um centro adminstrativo da cultura Huari e foi construído sob planejamento de arquitetos que levaram em conta o local sofrer com chuvas intensas durante o verão e desenvolveram sistemas de drenagem que ainda hoje funcionam, considerando que foi construída entre os séculos VII e VIII. A construição mede 583x566 metros, cercada com muros que tinha 5 metros de altura e em seu interior vários edifícios, foi uma sede governamental e sacerdotal onde viviam com seus servidores e trabalhadores e a população vivia aos arredores nos campos e pequenas vilas. O local foi ocupado até o século XV, em ocupações esporádicas e também mostra traços da ocupação Inca. 

 Laguna Sausacocha

Abaixo fotos de Wiracochapampa



 Já passava das 17 quando saí de Wiracochapampa e não iria ficar mais um dia pra ir até Markawuamachuco, fui pra estrada pra rodar até onde desse e chegar o mais perto possível do canion. Huamachuco já estava a 3.000 metros de altitude e eu ainda teria que cruzar uma cordilheira. Fui subindo e começou a garoar novamente e o frio a aumentar, meu único problema era com as mãos, minhas luvas não são impermeáveis nem muito boas para o frio. No top da cordilheira começou uma neve ralinha e o sol já se recolhia, neste momento comecei a me preocupar, eu não tinha as calças que tinha perdido e acampar naquela altitude e com aquele frio não ia ser possível decidi tocar até chegar a uma altitude e temperatura melhor. Cheguei em Shorey eram umas 20 horas, parei em uma delegacia para me informar com os policias a respeito do caminho que tinha traçado, a partir dali seria estrada de chão. O policial que me atendeu não conhecia bem a região, então ligou para um colega que conhecia as estradas por onde eu passaria e perguntou qual era o estado destas estradas, fui desaconselhado a seguir por elas e sim descer a cordilheira até Trujillo para então acessar o canion a partir da carretera Panamericana, isto acrecentaria uns 200 km, porém de asfalto o que em tempo não acrescentaria. Voltei então para a estrada, era apenas seguir em frente para chegar em Trujillo. Andei uns 50 km procurando lugar pra acampar e no escuro, não achava nada legal até achar uma ruazinha que ia para  um montanha, entrei nela e vi que ninguem passava por ela a tempos, achei um lugar plano e montei a barraca lá mesmo. Estava a 3.300 metros de altitude e já não estava tão frio.


 Esta cara estava em uma montanha perto de uma cidade que não lembro o nome.


 No alto da cordilheira com chuva e frio. Foi osso.

Local do camping pela manhã. 

Quilometragem do dia: 270 km
Quilometragem acumulada: 8625 km

25º dia de Yerba Buena a Cajamarca 260 km

25º dia
Dia 31 de dezembro de 2016



 Trajeto do dia.

Choveu um fininho durante toda a noite, pelas 4 horas da manhã ouço pessoas passando na rua e comentando que alguém tinha deixado um triciclo ali, se referindo a minha moto. Realmente não parecia que tinha barraca ali. Acordei com a lona da barraca no meu rosto, tinha quebrado uma vareta e já era a terceira vez que quebrava durante esta viagem. Eu tinha um pequeno espaço dentro da barraca que estava com uns 30 centimetros de altura. Eu não podia sair da barraca pra arrumar no escuro e a noite, então continuei assim mesmo até amanhecer. Outras pessoas também passaram pela barraca tocando vacas e permaneceram na esquina por quase uma hora conversando. Era a última vez que eu utilizaria aquela barraca, as varetas já estavam se desmanchando. Teria que comprar outra em alguma cidade grande neste dia.

Ao amanhecer desmontei a barraca e guardei tudo, já não chovia mais, apenas uma neblina no alto das montanhas. Fui informado de que  o caminho para percorrer à pé demoraria 25 minutos até os mausoléus, a placa indicava 3,5 km, só por isso já dava pra saber que não teria como fazer em 25 minutos, além de que eu estava a 2.300 metros de altitude e os mausoléus a 2.800 metros, um desnível de 500 metros significaria que teria que subir muito morro até chegar lá. Iniciei a subida as 7:45, por meio a trilhas em meio a uma mata baixa e com muito capim ao longo da trilha. Este capim estava molhado e conforme eu  progredia na trilha ia molhando a calça. Fui acompanhando as indicações de placas até achar uma que indicava que faltava 1 km, vi uma choupana ao pé da encosta rochosa da montanha a uns 500 metros de onde eu estava e uma trilha mais marcada que segui paralela a encosta rochosa, pensei que teria que seguir em frente para depois fazer uma curva e voltar até a choupana, segui na trilha e depois de pouco mais de 1 km vi que não estava no caminho certo. Já cansado tive que voltar até até a placa nela seguiria morro acima uma trilha que parecia não ser usada a tempos, subi por ela e então cheguei a choupana que é um mirante para o vale e para os mausoléus. Levei 2 horas e 15 minutos para chegar lá. Descansei um pouco, não tinha ninguém lá. Um portão impedia o acesso aos mausoléus. Olhei bem para as trilhas abaixo a procura de alguém subindo e não vi ninguém, então pulei a cerca e fui até os primeiros mausoléus, na única casinha que consegui ver dentro ainda tinha uma costela e alguns ossos de dedos. Tinha como subir e acessar os outros mausoléus, mas era arriscado e não quis arriscar, estava sozinho e se caio e fico vivo poderia demorar muito para alguém me encontrar. Os mausoléus Revash são da cultura Chachapoyas e imitam as casa que este povo habitava.
 Pulei a cerca novamente e iniciei a descida. Me perdi novamente quase no fim da trilha, andei quase 1 km e tive que voltar até achar a saída.

Abaixo fotos dos Mausoléus Revash







Voltei para o asfalto e logo estava em Leymebamba, procurei um posto lá e achei apenas um cara que vendia gasolina em casa, enchi o tanque e perguntei quanto tempo levaria para chegar até Cajamarca, que estava a 200 km de lá. O cara me falou: "De 4 a 5 horas."  Pensei que ele só poderia estar brincando, mas fui para a estrada e logo descobri que não estava bricando. A estrada é asfaltada, porém tem pouco mais de 3 metros de largura e sobe e desce montanhas com infinitas curvas, uma seguida da outra, e não tem como andar rápido. A paisagem é bela, muitos vales, montanhas e fazendinhas típicas peruanas e milhares de lombadas, a cada vilinha tinha pelos menos duas e em todas elas batia o fundo da moto, são lombadas altas e curtas. Peguei um trecho de montanha que tinha chovido muito na noite anterior e tinha barro na pista em alguns pontos, o que tornava ainda mais perigosa a condução por aquelas estradas estreitas e cheias de curvas. Perto das 13 horas parei no meio da montanha e um restaurantezinho e comi uma sopa de pato. Estava morto de fome pela caminhada de mais de 3 horas. 
Segui por mais alguns quilômetros e um cara com um triciclo na beira da rua me faz sinal para parar. Parei para ver o que ele queria. Queria saber se eu teria remendo para câmara, tinha furado o pneu dianteiro e ele estava desmontando com chave de fenda, falei que não tinha remendo, mas poderia emprestar a espátula, mesmo assim levou mais de meia hora pra desmontar o pneu. Enquanto fiquei lá esperando ele desmontar o pneu um colega dele ficou fazendo sinal para outros motociclistas e carros pararem e ninguém parava. Perguntei se era comum ninguém parar e ele disse que sim. Me pareceu que lá é cada um por sí e Deus por todos. Como não podia fazer mais nada, segui.


Abaixo fotos do caminho entre Leymebamba e Cajamarca





Na descida para a cidade de Balsas a vegetação já muda para semi-desértica e o calor aumenta, desce-se cerca de 1000 metros de altitude para cruzar um rio e logo sobe-se novamente. Como toda tarde sempre chove esta não foi diferente, ela me acompanhou até perto de Banos del Inca parei para esquentar as mãos algumas vezes, pois eu ja não sentia os dedos.
Chegando na cidade tive o primeiro grande susto da viagem. Depois de uma reta em uma descida havia uma curva para a esquerda com guardrail, vim freiando com os dois freios, como sempre faço, e quando começo a fazer a curva o pneu dianteiro escapou devido a areia na pista, a pista estava seca. Imediatamente solto o freio e seguro com o pé no chão, estava a uns 50 km/h, a moto volta, mas tenho que freiar novamente, pois estou indo pro guardrail. Neste momento milhões de coisas passam pela cabeça, lembrei da última viagem onde o colega quebrou a perna em um tombo besta em um guardrail, me passou também a queda e o que poderia acontecer ao bater no guardrail, são frações de segundo mas que o cérebro da gente trás a toma milhares de informações e realiza milhões de cálculo para nos tirar de uma situação de risco. Ao freiar novamente acontece o mesmo, o pneu dianteiro escorrega moto começa a tombar para a esquerda e mais uma vez seguro com o pé e ela volta e consigo então fazer a curva. Pela velocidade que eu estava e a distância do guardrail se eu chegasse a bater nele já seria devagar e não machucaria muito, mas para a moto certamente seria o fim da viagem. Depois deste susto segui com mais cuidado.
Cheguei em Cajamarca já ao anoitecer, comprei umas frutas e fui procurar um hotel, fazia uma semana que eu não tomava banho e era passagem de ano, eu merecia um conforto. Fiquei no primeiro que parei, custou 30 soles, R$30,00, quarto com cama de casal, banheiro no quarto, TV de 42" e limpo.
Depois de tudo certo no hotel fui comprar a barraca, pois sabia que no dia seguinte estaria tudo fechado. Em um hipermercado achei uma barraca por R$39,00, comprei mais algumas bolachas para os dias seguintes e voltei para o hotel, deixei a moto a 3 quadras do hotel em um estacionamento e fui debaixo de garoa para o hotel. Fui dormir antes da virada.
Quilometragem do dia: 260 km
Quilometragem acumulada: 8355 km